Por José Carlos da Fonseca Jr., diretor executivo da Ibá
É fato que, como civilização humana, enfrentamos o principal desafio para nossa existência na Terra: a emergência climática. Se em determinado momento tal agenda se restringiu às discussões acadêmicas e ao ativismo ambiental, já é possível sentir na vida cotidiana os seus efeitos. Reforçando esse sentimento, o Serviço de Mudança Climática Copernicus (C3S), da União Europeia, constatou que julho foi o mês mais quente desde que há registro.
Como um problema transversal e que afeta a todos de maneira cada vez mais intensa, a gestão da crise do clima tem sido tópico prioritário nos mais diversos fóruns globais. O sucesso dependerá, de forma impreterível, da colaboração entre os diferentes atores mundiais, bem como do avanço científico-tecnológico que advém de diversos campos. A mitigação e a adaptação ao desafio climático dependem do sucesso dessa coadjuvação.
Parte do cumprimento dessa jornada passa primeiro pela assimilação de que tudo o que é extraído da natureza precisa voltar a ela ou ser mantido em constante reciclagem. Alternativas a materiais de origem fóssil e uso único, de fato, precisam ser exploradas e continuamente desenvolvidas, sob risco de colocar em xeque a saúde do planeta e da humanidade — uma só saúde!
A máxima de que “não existe planeta B”, cada vez mais presente nos discursos de lideranças globais, também denota que a construção de um futuro viável passa pelo estabelecimento de uma nova face para a economia, mais verde e em consonância com o bem-estar da natureza e de todos que dela dependemos. No desenrolar desse percurso, o Brasil não pode desperdiçar a oportunidade de estar na vanguarda.
Somos donos da maior floresta tropical do planeta e concentramos a maior biodiversidade até hoje mapeada. Graças à Amazônia, dispomos de 12% da água doce do mundo. Ademais, construímos uma matriz energética diferenciada, 47% renovável. Sobram razões para que o país assuma o protagonismo nas discussões climáticas, na descarbonização da economia global e no respeito ao meio ambiente.
Na Amazônia, toda essa pujança ambiental pode se tornar insumo para o desenvolvimento social baseado na bioeconomia da região, gerando riqueza para a população e comunidades locais. Há uma extraordinária oportunidade para inovar a partir da biodiversidade de floresta, inclusive com soluções para a indústria farmacêutica, alimentícia, cosmética, entre outras. No entanto, para consolidar essa oportunidade, ainda precisamos superar ilegalidades que não podem mais ser toleradas, como o desmatamento, a grilagem de terras e o garimpo ilegal.
A indústria de base florestal vem se consolidando há décadas como um modelo de bioeconomia em larga escala, olhando para a natureza como a inspiração primeira de seus produtos, que têm origem renovável, são recicláveis e biodegradáveis. São livros, copos e canudos de papel, alimentos, remédios e até mesmo roupas — aquelas fabricadas a partir das fibras de árvores cultivadas já representam cerca de 5% do mercado têxtil global.
As opções que incluem os cerca de 5.000 bioprodutos fabricados pelo setor se mantêm em plena expansão, em função dos volumosos e permanentes investimentos em inovação, pesquisa e desenvolvimento dos múltiplos usos.
Na alimentação, a celulose solúvel já saiu dos laboratórios e dá origem a matérias-primas para fabricação de “peles” dos embutidos, como a salsicha e o salame. Produtos dietéticos também podem levar celulose solúvel, pois ela substitui a gordura animal e dá a mesma cremosidade para um o milk-shake diet, por exemplo.
Outro uso pouco conhecido é o da celulose também na pasta de dente, conferindo a textura firme que apresenta. Até mesmo as cápsulas de remédios recebem essa matéria-prima renovável, permitindo que os laboratórios desenvolvam medicamentos que serão liberados após o tempo necessário de ingestão ou no local correto do organismo humano.
Na indústria têxtil, a ascensão da celulose solúvel é fenômeno notável como parte do movimento global pela sustentabilidade. A viscose pode ser utilizada como opção em roupas, inclusive em tecidos delicados, para dar textura, como em gravatas, roupas íntimas, vestidos e até tecido jeans, além de toalhas e roupa de cama.
Reforçando que opções sustentáveis são cada vez mais um desejo do consumidor, a demanda por esses produtos segue crescente. Um exemplo palpável é a recém-inaugurada unidade da LD Celulose, joint venture entre a brasileira Dexco e a austríaca Lenzing. No início deste ano, visitei a fábrica no Triângulo Mineiro que tem capacidade para produzir 500 mil toneladas de celulose solúvel por ano. Toda essa produção já foi adquirida pela parte europeia em contratos de 25 anos. A matéria-prima dará origem a diferentes tecidos e artigos de moda sustentável para abastecer a crescente demanda do mercado europeu.
Hoje, são 9,9 milhões de hectares em que árvores produtivas são plantadas, colhidas e replantadas, em áreas comumente antes degradadas. Além disso, 6,05 milhões de hectares de mata nativa – área maior do que o Estado do Rio de Janeiro – são mantidos conservados pelo setor em mosaicos na paisagem, formando verdadeiros corredores ecológicos, o que beneficia o solo, a água e a biodiversidade. Ou seja, do cultivo ao produto, a cadeia carrega os princípios da sustentabilidade em seu DNA, compromisso quem vem construindo há décadas e que continuará pautando o setor em direção ao futuro.
Em um mundo de constantes novidades, mas que também enfrenta desafios para a continuidade da própria vida humana, a busca por alternativas de desenvolvimento e produtos sustentáveis deixou de ser opção e vem passando a requisito na rota para um amanhã saudável. Nesse sentido, o Brasil está cheio de exemplos capazes de oferecer esperança em um amanhã melhor para o planeta Terra e as próximas gerações.
Fonte: Portal Celulose