Por Paulo Hartung* para a CNN Brasil
Em recente reunião na Indústria Brasileira de Árvores (Ibá), Cândido Bracher afirmou: “Raros problemas globais têm tal grau de concordância como é o caso da mudança climática. Poucas pessoas discordam que o problema existe. Há consenso com relação à causa. E todos sabem o que, de fato, precisa ser feito para resolver”.
O sentido de urgência e o clamor da sociedade por ações efetivas no combate ao aquecimento global nunca foram tão grandes. As Conferências das Partes (COPs), é preciso reconhecer, têm tido o mérito de impulsionar a discussão nos últimos anos, ultrapassando os muros da academia e da diplomacia.
Mas isso tudo não tem bastado. A hora agora é de agir e este é o ponto em que o mundo tem patinado. O ano de 2024 teve a chance de ser lembrado como o ano em que transformamos anseios em ações. As três COPs realizadas no período traziam essa possibilidade. A alta expectativa, no entanto, deu lugar ao gosto amargo da frustração.
A COP 16 da Biodiversidade, em Cali, sequer foi encerrada. Sem consenso e por falta de quórum, a Cúpula foi suspensa e a discussão será retomada em Roma, no mês de fevereiro de 2025. A bola de ferro que impediu o desfecho da reunião foi a mobilização de recursos, que incluía a criação de um instrumento de financiamento global dedicado à biodiversidade. Países ricos, que já sinalizavam oposição à ideia, não aceitaram a proposta e deixaram a mesa de negociação. Sem esta definição, ficamos distantes da possibilidade real de se implementar, em sua plenitude, o Marco Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal, consensuado com muito suor em 2022, no Canadá. Trata-se de péssimo sinal.
Já em Baku, entre dúvidas e expectativas, a 29ª Conferência do Clima iniciou surpreendendo positivamente. O artigo 6 do Acordo de Paris foi, finalmente, aprovado, passo fundamental para que, enfim, saia do papel o mercado regulado global de créditos de carbono. Importante destacar o trabalho diplomático realizado pelo Brasil no processo: a inclusão de remoções florestais no texto é vital para o país, que, notadamente, está na vanguarda do cultivo de florestas para fins industriais e de restauro.
A arrancada inicial no Azerbaijão, entretanto, não ganhou tração. A então ainda rotulada COP das Finanças ficou muito aquém do esperado. Enquanto o pleito dos países em desenvolvimento para o financiamento climático era de US$ 1,3 trilhão, o texto final previu “até” US$ 300 bilhões anuais. Um balde de água fria para quem acreditava que algo para além de promessas poderia ser efetivamente endereçado.
Ainda mais triste e preocupante foi a inércia desta COP 29 em impulsionar o desmame dos combustíveis fósseis na geração de energia, fator decisivo para enfrentamento da crise climática. O tema, no entanto, explicitamente foi empurrado com a barriga.
Por fim, Riad, na Arábia Saudita, que abrigou a COP 16 da Desertificação, foi palco para repetição do conhecido enredo: a reunião foi encerrada sem acordo. Ali, sequer foi possível chegar a um Marco Global, com metas e prazos para enfrentamento da seca, que atinge especialmente nações africanas. O tema foi postergado para 2026, quando será realizada nova Cúpula, na Mongólia.
Tal cenário traz desafios que precisamos enfrentar e superar. As lideranças planetárias estão, há anos, deixando a desejar. Ações isoladas não moverão o ponteiro. É preciso uma verdadeira concertação global em torno do combate às mudanças climáticas. O esforço necessário para isso, no entanto, não tem sido suficiente.
É preciso que os países ricos botem a mão no bolso, sim! Por dois séculos, despejaram milhões de toneladas de CO2 na atmosfera, prejudicando todo o planeta em benefício próprio. Não podem mais se esquivar da responsabilidade. Do mesmo modo, é preciso que nações em desenvolvimento combatam ilegalidades ambientais que colocam o clima em risco. Não podemos mais tolerar desmatamento, queimadas e grilagem de terra, entre outros atos que agridem a natureza e colocam nosso futuro ainda mais em risco.
Todos esses episódios sobrecarregam a agenda da COP 30, que o Brasil sediará em 2025. Não podemos cair no erro de deixar que rotulem como a COP da Floresta. Após 10 anos do Acordo de Paris, esta é a COP do realinhamento das metas de cada país para redução das emissões de gases de efeito estufa, conhecidas como Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), de modo a torná-las realmente exequíveis.
Teremos em nosso território, no coração da Amazônia, a oportunidade de reforçar para o mundo que nossa matriz energética já tem 47% de fontes renováveis. Podemos ser uma inspiração, bem como um parceiro seguro nessa transição. Será momento de apontar que as mesmas regras de países com clima temperado não podem ser aplicadas às regiões tropicais. A discussão tem que ser de igual para igual, baseada na melhor ciência, mitigando o recorrente ímpeto europeu em ditar regras para o mundo.
Será momento para intensificar a luta pela transição dos combustíveis fósseis para fontes limpas na geração de energia, além de reforçar o movimento no sentido de evoluir, de maneira real, no financiamento climático.
A verdade é que a complexa conjuntura global, alimentada pela crise do multilateralismo, é um fator complicador nesta caminhada. Fica evidente que está faltando liderança com capacidade de mobilização para que esta jornada climática seja colocada no trilho das ações.
Nesse vácuo, o Brasil pode cumprir um papel. Para isso, o país tem de fazer a lição de casa, o que inclui ouvir atentamente os mais diversos setores da economia, assim como a sociedade civil. É preciso, também, alinhar uma estratégia factível e assertiva, tarefa já em atraso, para, enfim, deixar claro o que realmente queremos da COP Belém.
* Economista, presidente da Indústria Brasileira de Árvores (IBÁ). Foi governador do Espírito Santo